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sexta-feira, 25 de março de 2011

OBJETOS NÔMADES




  Texto Francisco Orban

         O rosto opilado dos sonhadores já não fere a lua. Nem mesmo quando ela, afastada de sua função, a eles lança a luz de seus barcos.
         Esse foi o primeiro sintoma do vento que vi naquele homem alquebrado pelas mazelas do mundo. Vinha de um inverno assolado pela memória de tantos outros e trazia no rosto o estigma dos sonhadores,  a solidão sem fim que esse enigma engendra, assim como o ar dos andarilhos. Nunca entendi sua morte, súbita e velada apenas pelos pássaros do mar em sua passagem pelos confins da terra.
         De seu inventário de objetos nômades, só ficaram uns sapatos velhos, gastos pelo caminhar nos tombadilhos e planetas que nunca supomos. Envolvidos só conosco, não podemos entender a origem desses sonhos e desse povo, que não buscou nenhum lugar e só se compraz com o hábito de escutar o  silêncio da terra.
         A harmonia com os fenômenos minerais, o intenso amor pelo mar, os veleiros que largaram no horizonte. As bandeiras desfraldadas  de  pátria alguma  fizeram dos sonhadores a antítese desse tempo, onde não cabem mais os juramentos de transcendência e os caminhos que os norteavam em seu movimento  de  emigrantes da terra.

Do livro de Francisco Orban, Leilão de acasos, (editora Garamond
tel 021.25049211)

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